Subversão queer da clássica marchinha homofóbica, “Será Que Ele é?” antecipa o próximo disco de Yantó
Ainda no aquecimento do lançamento de seu próximo disco, “Sítio Arqueológico”, previsto para outubro deste ano, Yantó apresenta “Será que ele é?”, segundo single do trabalho. Com produção do próprio músico e de seu parceiro Tó Brandileone (5 a Seco), faixa traz uma divertida apropriação de um dos refrões mais emblemáticos (e talvez problemáticos) do carnaval.
É justamente da paródia de uma das marchinhas mais populares e polêmicas do Carnaval que nasce a divertida obra. Nela, Yantó desloca a provocação ofensiva da pergunta original para o campo do desejo e do flerte ao colocá-la como curiosidade que atiça ainda mais o interesse do eu-lírico da canção por um personagem dúbio e fluido que, como a própria letra diz, não cabe em “caixinhas”.Para Yantó, faz parte de um processo de revisão histórica criar novas referências para o imaginário ligado ao universo LGBTQIAP+. “Eu acho que cantar essa mesma questão, ‘será que ele é?’, nesse lugar de flerte, de desejo, de paquera, é um jeito de provocar e desconstruir de forma divertida e leve vários estigmas. Esse caminho descontraído tem me interessado mais ultimamente. Questões de sexualidade e gênero sempre estiveram presentes no meu trabalho. Não por ser um assunto sobre o qual eu queria falar, mas porque isso é parte de mim, é parte de quem eu sou. Então é algo que vai sempre aparecer, naturalmente, com nuances diferentes. Quando componho uma canção de amor, de desejo, de paixão, ela provavelmente vai refletir a minha própria sexualidade. E em cada momento da vida isso virá de uma forma diferente. Nesse disco que estou prestes a lançar, por exemplo, essas questões vêm muito mais como peças de um cotidiano do que como um discurso direto e político, ainda que sempre seja político”.
Cabe dizer que a ligação de Yantó com o carnaval é bastante visceral, uma vez que o artista é cantor de um dos maiores blocos do carnaval de São Paulo, o Bloco Explode Coração, que leva todos os anos uma média de 200 mil foliões para as ruas em seu desfile oficial em uma homenagem à cantora Maria Bethânia. “Tem muita discussão hoje em dia sobre o ‘politicamente correto’ no carnaval. Muita gente que diz que esse papo é censura. Ou seja, muita gente que se vale de um discurso que parece libertário, mas que no fundo é reacionário. Marchinhas racistas e homofóbicas são só isso mesmo, racistas e homofóbicas. Não tem outro nome possível. O espírito de expansão dos limites a que o carnaval nos convoca não tem nada a ver com rompimento do limite ético do respeito às diferenças. Se não é possível brincar sem ofender, é melhor não brincar”, comenta.
A canção foi composta inicialmente em 2018 e maturada ao longo dos últimos anos até ganhar a forma final gravada no disco. Seguindo o caminho de “Abre Alas”, primeiro single do álbum lançado em agosto, a faixa incorpora simultaneamente elementos eletrônicos e acústicos. Em levada de samba-funk, o arranjo mistura sintetizadores, vocoders e programações de Yantó à bateria cheia de swing de Alana Ananias e ao violão à la Jorge Ben de Tó Brandileone. Destaque também para o “nipe de assobios” de Brandileone que, também, assina a mixagem.
O single vem acompanhado de um visualizer que traz Yantó dançando de forma descontraída e irreverente com figurino de Alma Negrot, responsável por assinar a direção criativa de toda a parte visual do projeto. A foto de capa é de Gustavo Lemos. Além dos singles, o aquecimento para o lançamento do disco conta com shows de Yantó em Campinas (04 de outubro no Festival do Instituto de Artes da UNICAMP), Araçatuba (12 de outubro no FESTA – Festival de Teatro de Araçatuba) e São Francisco Xavier (14 de outubro Sede Mantiqueira da Núcleo Educatho).
Foto: Gustavo Lemos